M’Boi Mirim, que é tanto o nome de um bairro, de uma subprefeitura, e de uma estrada, todos na cidade de São Paulo, claramente apresenta origem tupi (ou guarani, dado que seus primitivos habitantes parecem ter sido guaranis; o que importa é que em ambas as línguas o nome seria o mesmo, neste caso). Para saber o porquê de sua pronúncia ser do jeito que é, façamos uma digressão.
Em tupi (e em guarani), a letra ‘m’ permitia duas pronúncias diferentes, a depender do contexto: uma com ‘m’ mesmo, de maçã, e outra, mais oralizada, de ‘mb’. Este último som é bem característico de muitas línguas tupi-guaranis, bem como de línguas africanas, em especial as do grupo banto, que, assim como o tupi, emprestaram muitas palavras ao português brasileiro.
Quando esse som de ‘mb’ ocorria no meio da palavra, esta passava para o português da mesma forma, sem mistério. Daí que kambará, nome de uma planta, passou a ser CAMBARÁ, nome de uma planta.
Todavia, quando ‘mb’ ocorria no início de palavra, surgia um problema. Não há em português palavras que comecem com esse som. Portanto, é necessário fazer adequações à fonologia da língua que recebe o empréstimo lexical. Por esse motivo, o ‘mb’ em início de palavra tornou-se ora ‘b’, ora ‘m’. Assim, o tupi mbeiú, nome de um alimento, virou BEIJU no português brasileiro, e mokó (ou mbokó) virou MOCÓ.
O caso de M’Boi Mirim é particular. Seu nome vem do tupi mboia, que significa cobra, e mirĨ, pequena. Como mboia começa com ‘mb’, seria de se esperar que virasse BOIA ou MOIA em português (o que de fato aconteceu em palavras como BOIUÇU, MOGI-GUAÇU e muitas outras). Ocorre que, neste caso particular, o nome M’Boi Mirim foi aportuguesado de uma forma única: passou-se a pronunciar o nome da letra ‘m’.
Conforme explica a Folha de S. Paulo
M’Boi era uma das transcrições possíveis para a palavra indígena pronunciada como Em-boi ou Em-bu (vem daí o nome dos municípios vizinhos). Sem contato com a fonética dos indígenas (já expulsos do local), os imigrantes recém-chegados só podiam pronunciar conforme liam nas placas da estrada. Ficou “eme-bôi”.
Eis, portanto, a curioso motivo da pronúncia.
Fontes
RODRIGUES, Aryon Dall’Igna. Phonologie der Tupinambá-Sprache. Universidade de Hamburgo, Alemanha, 1958.
CAPRIGLIONE, Laura. «Documentário expõe histórico de destruição de avenida paulistana – 17/04/2010». www1.folha.uol.com.br. Consultado em 24 de novembro de 2024
(Imagem meramente ilustrativa)

